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  • Foto do escritorINSTITUTO FLÁVIO LUCE

60 anos: VIVA E VIDA PARA A ESCOLA DE SAÚDE PÚBLICA SAÚDE PARA A ESCOLA DE SAÚDE PÚBLICA*


POR FERNANDO MOLINOS PIRES FILHO

Com essas duas consignas, saúdo e me uno a todos vocês presentes nesta cerimônia de homenagem e de comemoração aos 60 anos da Escola.

Incorporo a esse nós de hoje colegas e companheiros que, por dificuldades várias também não puderam se fazer presentes. Mas, de forma especial, incluo aqueles de ontem, que não mais estão conosco, mas foram protagonistas dessa jornada de construção da Escola e, junto com ela, merecem ser homenageados.

Nesse sentido peço licença a vocês para, neste momento, lembrá-los e, em nome de todos, citar alguns, que foram ícones precursores dessa história e muito bem representam a todos que se seguiram nessa jornada.

Paulo Chaves, Ernani Saldanha de Camargo, Maria Helena Regis Alvim, Carlos Reinaldo Mendes Ribeiro, Jorge Ossanai e Airton Fichmann, O primeiro Chefe da Unidade de Planejamento da Secretaria de Saúde que muito se empenhou na criação da Escola, os cinco seguintes diretores da Escola. Cito, ainda, Germano Bonow Secretário da Saúde que se empenhou na construção do Prédio que hoje abriga a Escola e deu grande apoio a constituição de seu corpo funcional.

Fico com a certeza de que quem nesses 60 anos passou pela Escola jamais poderá esquecê-la. Saímos da Escola, mas a Escola não saiu de nós.

Eu pelo menos a tenho comigo desde seus primeiros anos de existência, quando ainda a funcionava em algumas salas na parte lateral do Posto de Saúde Modelo, depois no Edifício Coliseu de onde saiu para ocupar o prédio em que até hoje ocupa na Avenida Ipiranga. Dela sai, após de 1980 a 1983, ter ocupado o cargo de Diretor.

A partir de agora minha fala, em função dessa vivencia que tive, está voltada para dizer o que entendendo, o que sinto e o que desejo compartilhar com vocês em relação à ela no que respeita ao seu ser e aos seus fazeres em sua missão de, pelo seu trabalho, ajudar a construir um amanhã melhor que o insatisfatório de hoje em relação a saúde da sociedade brasileira e de seu povo, em particular o do nosso Estado.

Com esse propósito, dessas duas frases que me utilizei para saudá-la, destaco quatro palavras: saúde, vida, escola e pública. Palavras que articuladas nos ajudam a dar significado e sentido ao que queremos expressar.

Vou juntá-las em dois blocos. Um com as palavras saúde e vida e o outro com escola e pública. Vamos a eles.

Quanto a saúde e vida o que se pode dizer é que andam juntas. Na verdade saúde é vida, é qualidade de vida, é a expressão das contradições que as mulheres e os homens vivenciam no experienciar do seu próprio viver em sociedade, ou seja, uma condição que sempre, mas de forma qualitativamente diferenciada, estará presente, em função do grau de justiça e equidade alcançado pela sociedade.

Neste sentido e com esse entendimento o que se pode dizer é que a saúde - objeto de que se ocupa a escola - se constitui muito além de um problema individual em uma questão social, coletiva e de relevância pública, como refere nossa Constituição, um direito de cidadania e um dever do Estado.

Saúde, pois, ao contrário da doença, não se cura. Saúde não se previne. Saúde não se vende, nem se alcança e nem se garante somente com atos médicos. Saúde, vida, qualidade de vida se promove.

Eis aqui a primeira missão da Escola: ajudar a promover saúde. Um conceito que baliza suas práticas educativas e orienta a lógica de seus fazeres, como recomenda a própria Organização Mundial de Saúde e como reza, também, nossa Constituição Federal ao indicar que saúde se promove e se dispensa mediante:

1º - o desenvolvimento de políticas públicas, voltadas para a superação das condições sócio econômicas, restritivas à qualidade de vida,

2º - o emprego de medidas que se comprometam com a preservação e melhorias do meio ambiente

3º - a humanização de nossas relações sociais e de trabalho e,

4º sem dúvidas, por meio de uma prática médica transformada onde seus elementos estruturais, integrados, conformem modelos ou sistemas de abordagem que invertam a atual pirâmide de valores, voltados hoje para a assistência e cura das doenças e que,

5º - por outro, voltem-se e comprometam-se com a promoção de saúde.

Eis aqui a razão e o conteúdo orientador do agir da nossa Escola de Saúde Pública – a de apoio a essas ações transformadoras das praticas institucionais o que implica no emprego constante da reflexão sobre o seu próprio agir.

A reflexão de que falo não é um olhar meramente contemplativo, um olhar de constatação do que se faz ou não se faz, mas um exercício, um ato consciente de ler criticamente a realidade para compreendê-la com o objetivo de nela intervir. A reflexão, enquanto interpretação crítica da realidade e do que estamos fazendo ou está sendo, só ganha sentido quando contribui para instalar a dúvida, a negação e fundamentar a capacidade para o protagonismo transformador. Eis aqui o jeito indagativo, instigador, provocador e, um tanto perturbador do status quo, que por vezes se instá-la nas instituições e trava sua renovação em direção a qualificação e consequência de seu modo de agir.

Portanto a promoção de saúde, enquanto uma estratégia substitutiva aos atuais paradigmas de práticas de saúde, hoje centradas no biologisismo - influenciado pela incorporação de conhecimentos cada vez mais avançados do campo da genética, da anatomia e da fisiologia do corpo humano e do tecnicismo clinico e cirúrgico - decorrentes em muito da incorporação acrítica do acelerado processo das inovações da tecnociencia - contempla duas tarefas absolutamente indissociáveis do trabalho educativo que cabe a Escola de Saúde:

Uma delas diz respeito à importância de, em suas atividades de formação e requalificação dos profissionais, incorporar saberes e conhecimentos das áreas das humanidades de forma que os habilitem em suas praticas a cuidar dos homens em sua integralidade de seres sociais e não apenas de seus corpos físicos.

A outra nessa mesma linha qualificativa ao agir dos profissionais diz respeito a atitude de compromisso que precisa, em seu trabalho, assumir em relação a permanente necessidade de qualificação da gestão do SUS - a forma tecno/política estabelecida e escrita pela sociedade, na Constituição Federal, para abordar a questão da saúde em nossa sociedade. Compromisso, sobretudo no que diz respeito a introdução de avanços nos processos de municipalização e distritalização da atenção a saúde e no protagonismo em relação a disputa por recursos financeiros, materiais e humanos suficientes, adequados e necessários ao aprimoramento de suas práticas demandadas pelos novos modelos de atenção à saúde que, como já dissemos, tomam a saúde e não as doenças como referência, ainda que se continue tendo necessidade e dever de continuar praticando a assistência voltada para a prevenção e para os tratamentos clínicos, cirúrgicos e medicamentosos na tentativa de evitá-las e curá-las.

A esse respeito é preciso um alerta. Essa é tarefa das mais difíceis na medida da resistência a essa linha de ação que se estabelece tanto de parte dos profissionais, formados sobre outra ótica, como da população que, premida pelas circunstâncias da sua condição de vida, pelo apelo mercantilista do setor privado de oferta de procedimentos médicos, do assédio do setor de comercialização de medicamentos e até mesmo das praticas religiosas que acenam com a cura milagrosa, torna-se presa fácil da valorização da cura das doenças em detrimento das praticas preventivas e de promoção da saúde.

Eis aqui, portanto, outra contribuição que a Escola em seu agir pode aportar para a ação da Secretaria da Saúde da qual faz parte, qual seja a de mediar, por meio de sua ação educativa a relação com a população e com o próprio corpo funcional da Secretaria.

Também cabe a escola desenvolver, tanto em referência a população, quanto aos trabalhadores de saúde e ao próprio poder publico a cultura da ação participativa, dialógica e de protagonismo em relação aos Conselhos de Saúde e aos fóruns e Conferencias de Saúde, bem como a outros mecanismos e praticas que demandam a participação dos profissionais e da comunidade nas questões relacionadas a promoção e proteção à saúde sob responsabilidade da Secretaria.

Desses dois aspectos, prevenção e cura das doenças, sem dúvida, as Universidades, por meios dos cursos de formação de profissionais de diferentes áreas da saúde, tem se ocupado, alcançando nesse aspecto, cada vez mais, bons níveis de qualidade, mas salvo raras exceções, pouco tem se dedicado a promoção da saúde. Tarefa que, em uma ação complementar, tem se ocupado a Escola de Saúde Pública por meio de suas atividades de formação entre as quais se destacam os Cursos especialização em Saúde, que forma os profissionais sanitaristas e as Residências Integrada Multiprofissionais em Saúde que proporcionam aos profissionais de saúde vivencia prática em diferentes áreas como gestão em Saúde, Vigilância em Saúde, Dermatologia Sanitária, Saúde Mental Coletiva e, Atenção básica.

Isso dito os convido, agora, para pensar em relação a três perguntas que une as duas outras palavras que compõem este segundo bloco que tenta organizar a parte final de minha fala: escola e pública.

O que, realmente, é uma escola? O que é uma Escola pública? O que é a nossa Escola de Saúde Publica?

Antes de construir uma resposta a essa pergunta cabe uma observação. Vamos usar um exemplo para facilitar o entendimento sobre o que estamos a destacar com a observação - o nosso caso. Quando somos levados a responder o que somos mesmo que respondendo, não somos o que dizemos que somos. O que somos, na realidade, se explica pelo que fazemos, como fazemos, para quem fazemos, e com que propósito fazemos.

Assim, inicialmente cabe na resposta as perguntas o que é uma escola?, o que é uma escola publica o que é uma escola de saúde publica como a nossa, fazer uma desconstrução a tradicional tentativa de identifica-la para o conhecimento de todos, em geral, feita apenas pelo prédio que a abriga, pela placa que anuncia seu nome e a entidade a que pertence. Tal forma explicativa não é suficiente para esclarecer sobre sua completa ou verdadeira identidade. Ou seja, o prédio e a placa não tem as informações e os qualificativos que permitem conhecer o seu objeto de trabalho, o que faz, como faz, para quem faz e com que propósito faz, e, ainda qual a relação do que faz com a instituição a que pertence e, qual é seu papel em relação a sociedade.

Neste sentido a par do que no bloco anterior de nossa fala já dissemos em relação a nossa escola que é de saúde e publica, cabe uma rápida incursão que ajuda na resposta as perguntas que nos propusemos.

As escolas como se sabe baseiam seu fazer no campo da educação e da ciência, não existem apenas para ensinar a ler e escrever. São espaços que habilitam as pessoas para a sociabilidade, para a capacidade do pensar livre, para a reflexão, para a produção de saberes, para habilitação dos indivíduos para o mundo do trabalho e como nos ensina Paulo Freire um meio para despertar e qualificar os níveis de consciência das pessoas para interpretar e protagonizar na transformação da realidade de nossa sociedade. As escolas públicas precisam ter e preservar essa natureza. Não podem deixar se contaminar com a natureza e a forma de ser e fazer das escolas privadas que em seus seres carregam os propósitos comum ao mundo dos negócios, ainda que algumas tentem de diferentes formas escamotear essa origem, mediante a grandeza de seus prédios e o oferecimento de facilidades no que se refere ao pagamento de suas altas mensalidades medidas insuficientes para encobrir seu caráter comercial e sua perspectiva de lucro que faz da educação uma mercadoria acessível somente aos que por ela podem pagar. Daí o compromisso de colocar a prática profissional da Escola a serviço de torná-la cada vez mais humanizada, menos conflituosa, menos desigual, mais solidária, mais justa, mais democrática e menos adoecedora, sobretudo comprometida com a vida, em um planeta em destruição acelerada, frente a olhares cegos e descompromissados de todos a quem caberia preservá-la, o que não exclui nós mesmos, cidadãos, trabalhadores profissionais em nossos diferentes campos de atividade. Tarefa para a qual as escolas de saúde, em suas falas e fazeres precisam voltar seus olhares e assumir com esse propósito seu papel educador.

Nessa perspectiva sem dúvida o trabalho educativo, a essência a razão de ser uma escola pública é o de preservar seu compromisso e de influenciar a Instituição a que pertence a constante reflexão, que também, já falamos de não ceder ou se afastar de seu inalienável compromisso de trabalho voltado para a construção de uma sociedade saudável.

Finalmente a meus colegas do corpo funcional da Escola, técnicos e administrativos, de todos esses 60 anos uma palavra: Orgulhemo-nos! Como funcionários públicos, nesse trabalho, não temos clientes a nossos cuidados mas uma comunidade inteira. Pode haver algo mais dignificante do que isso?

Quanto a nossos salários ... bem falemos disso outra hora, afinal salário também é questão de saúde.

Muito obrigado a todos e, mais uma vez:

Viva e vida a nossa Escola de Saúde Pública

Saúde para a nossa escola de Saúde Publica

*Fala feita por ocasião da homenagem prestada a Escola de Saúde Publica do Estado do RS pela passagem de seus 60 anos de existência no Teatro Dante Barone da Assembléia Legislativa do RS


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